A jornada espiritual que se desdobra por cinquenta dias, conectando a celebração da Páscoa (Pêssach) à festividade de Shavuot (Pentecostes), representa um período de profunda transição e preparação. Enquanto a Páscoa marca a libertádora saída do povo judeu da escravidão no Egito, Shavuot comemora a entrega da Torá no Monte Sinai – o momento em que se tornaram uma nação com um propósito divino. É uma época, portanto, que deveria ser preenchida com alegria e uma antecipação crescente pela recepção das leis e preceitos divinos.

No entanto, este período único no calendário judaico, conhecido como a "Contagem do Omer" (em hebraico, Sefirat Ha'Omer), carrega consigo uma camada inesperada de solenidade e até lamentação. É precisamente essa dualidade – a alegria inerente à libertação e à aproximação da Torá, mesclada com um senso de luto – que o torna um dos períodos mais enigmáticos e paradoxais do ano judaico.

A Contagem do Omer: Uma Ponte Entre a Redenção e a Revelação

A prática da Contagem do Omer é uma mitsvá (mandamento) bíblica, derivada da Torá, que instrui a contagem de quarenta e nove dias completos a partir da segunda noite de Páscoa até a véspera de Shavuot (Levítico 23:15-16). Originalmente, nos tempos do Templo Sagrado em Jerusalém, essa contagem estava ligada à oferta diária de uma medida de cevada (o "omer") como primícias da colheita. Espiritualmente, a Sefirat Ha'Omer simboliza uma jornada de aprimoramento pessoal: a cada dia, reflete-se e trabalha-se em uma das sete emoções ou qualidades (sefirot), preparando a alma para receber a Torá com pureza e compreensão.

O Período de Luto: Uma Tragédia na História Judaica

Apesar de seu propósito de elevação, grande parte do período do Omer é marcada por costumes de luto. A razão histórica para essa lamentação reside em uma tragédia ocorrida no século II d.C., durante a época do grande sábio e místico, Rabbi Akiva. De acordo com o Talmude (Yevamot 62b), vinte e quatro mil de seus alunos, figuras proeminentes em uma era de perseguição romana e de grande aprendizado da Torá, faleceram devido a uma praga divina. Esta calamidade foi atribuída à falta de respeito mútuo entre eles, uma dura lição sobre a importância fundamental do amor e da unidade entre os judeus.

Como sinal de luto por essa perda imensa, muitas atividades normalmente associadas à alegria e à celebração são suspensas durante a maior parte do Omer. Isso inclui:

As práticas específicas e a duração do luto podem variar ligeiramente entre as comunidades judaicas ashkenazitas e sefarditas, ou mesmo entre tradições regionais, com alguns observando o luto até Rosh Chodesh Sivan (o início do mês que precede Shavuot), e outros até o dia 33 do Omer.

Lag Ba'Omer: Um Raio de Luz na Contagem

A 33ª dia da Contagem do Omer, que cai no 18º dia do mês hebraico de Iyar, é o feriado menor e alegre de Lag Ba'Omer ('Lag' é a representação numérica das letras hebraicas Lamed e Gimmel, que somam 33). Este dia marca um ponto de viragem significativo e a interrupção das restrições de luto, e é celebrado por duas razões principais:

  1.  O fim da praga: Foi em Lag Ba'Omer que a praga que afligia os alunos de Rabbi Akiva milagrosamente cessou. É um dia de alívio e de gratidão pelo fim da calamidade.
  2.  O Yahrzeit de Rabbi Shimon Bar Yochai: Lag Ba'Omer também é o aniversário do falecimento (Yahrzeit) de Rabbi Shimon Bar Yochai, um dos maiores alunos de Rabbi Akiva e o autor tradicional do Zohar, o texto fundamental da Cabala (a mística judaica). Segundo a tradição, no dia de sua morte, Rabbi Shimon Bar Yochai revelou os segredos mais profundos da Torá, enchendo o mundo com uma luz espiritual sem precedentes. Por isso, Lag Ba'Omer é uma celebração da Torá Mística e da luz interior.

As celebrações de Lag Ba'Omer são vibrantes e repletas de costumes únicos:

O período entre Páscoa e Shavuot, com Lag Ba'Omer como seu ponto culminante, é, portanto, mais do que uma mera contagem. É uma odisseia espiritual que abraça a libertação da escravidão física e a preparação para a liberdade espiritual da Torá, pontuada por lembranças de perdas e celebrações de luz e revelação.

Perguntas Frequentes sobre a Contagem do Omer e Lag Ba'Omer

O que é a Contagem do Omer?
A Contagem do Omer é um período de 49 dias, a partir da segunda noite de Páscoa até a véspera de Shavuot, durante o qual os judeus contam cada dia. É uma mitsvá bíblica que simboliza a ponte entre a libertação física (Páscoa) e a recepção da Torá (Shavuot), sendo também um período de aprimoramento espiritual.
Por que há costumes de luto durante o Omer?
Os costumes de luto são observados em memória de vinte e quatro mil alunos do Rabbi Akiva que faleceram devido a uma praga durante este período, supostamente por não demonstrarem respeito uns pelos outros. Para homenagear essa perda e refletir sobre a importância da unidade, práticas como não cortar o cabelo, não ouvir música instrumental e não realizar casamentos são suspensas.
O que significa Lag Ba'Omer?
Lag Ba'Omer significa "o 33º [dia] do Omer". É um dia de celebração que marca a cessação da praga que afligiu os alunos de Rabbi Akiva. Também é o aniversário de falecimento (Yahrzeit) de Rabbi Shimon Bar Yochai, o autor do Zohar, principal texto da Cabala, tornando-o um dia de revelação e luz espiritual.
Quais são os costumes de Lag Ba'Omer?
Os costumes de Lag Ba'Omer incluem acender grandes fogueiras, cortar o cabelo (especialmente para meninos de três anos), ouvir música e realizar casamentos, já que o luto é suspenso. Crianças também brincam com arcos e flechas, simbolizando a Torá e a unidade.
Onde Lag Ba'Omer é mais celebrado?
Embora celebrado por comunidades judaicas em todo o mundo, Lag Ba'Omer tem uma celebração particularmente grandiosa em Israel, especialmente na cidade de Meron, perto do túmulo de Rabbi Shimon Bar Yochai. Milhares de pessoas se reúnem lá para orar, cantar, dançar e acender fogueiras.