O Egito, em 30 de junho de 2013, vivenciou um dos momentos mais turbulentos e controversos de sua história contemporânea. Nesta data marcante, exatamente um ano após a sua posse, milhões de manifestantes tomaram as ruas em todo o país para exigir a saída do então presidente, Mohamed Morsi. Ele, que havia sido o primeiro presidente democraticamente eleito após a emblemática Revolução de 25 de Janeiro de 2011 – o levante popular que derrubou o regime de Hosni Mubarak –, viu sua breve e polarizadora gestão de apenas doze meses chegar a um ponto de inflexão.
A Ascensão e a Queda: O Contexto da Presidência de Morsi
A presidência de Mohamed Morsi, figura proeminente da Irmandade Muçulmana, iniciada em 30 de junho de 2012, foi marcada por intensa polarização e descontentamento crescente. Embora sua eleição representasse um avanço democrático significativo para o Egito pós-revolucionário, suas políticas e decisões rapidamente erodiram o apoio público. Crucialmente, a “Declaração Constitucional” de novembro de 2012, que expandiu seus poderes e o colocou acima da supervisão judicial, juntamente com a apressada aprovação de uma nova constituição percebida como islamista e excludente, alienou vastos setores da sociedade civil, incluindo liberais, seculares e minorias como os cristãos coptas. Além disso, a estagnação econômica e a percepção de uma governação ineficaz agravaram a frustração geral da população.
Tamarod: A Petição que Inflamou as Ruas
Nesse cenário de crescente insatisfação, emergiu o movimento “Tamarod”, que significa "Rebelião" em árabe. Lançada em abril de 2013, essa campanha de petição popular rapidamente ganhou uma tração sem precedentes, capitalizando sobre o profundo descontentamento. O Tamarod alegava ter coletado mais de 29 milhões de assinaturas em apenas alguns meses, um número que, se preciso, superaria até mesmo os votos que Morsi recebeu em sua eleição presidencial. A petição exigia a demissão imediata de Morsi e seu governo, além da convocação de eleições presidenciais antecipadas, e serviu como um poderoso catalisador para os protestos massivos que culminariam em 30 de junho.
A Intervenção Militar: Golpe ou Revolução?
A efervescência popular culminou na intervenção do exército egípcio. Em 3 de julho de 2013, o General Abdel Fattah el-Sisi, então Ministro da Defesa e chefe das Forças Armadas, anunciou a remoção de Mohamed Morsi do poder, a suspensão da constituição e a nomeação de um chefe de justiça interino. Esse evento é amplamente referido como um golpe de Estado por muitos observadores internacionais e organizações de direitos humanos, dado o papel do exército na destituição de um presidente eleito democraticamente. Contudo, o exército egípcio e seus apoiadores no Egito insistentemente classificaram o ocorrido como uma “Revolução de 30 de Junho”, argumentando que a intervenção militar foi uma resposta legítima ao clamor do povo, que exigia a mudança e a restauração da ordem. Essa dicotomia entre "golpe" e "revolução" permanece um ponto central e controverso na narrativa dos eventos.
Os Números em Disputa: Quantos Manifestantes Realmente Havia?
Um dos aspectos mais debatidos e, simultaneamente, mais controversos da "Revolta de 30 de Junho" são as estimativas sobre o número de manifestantes. O exército egípcio postulou que se tratou da maior demonstração na história do Egito, alegando que aproximadamente 32 milhões de pessoas participaram dos protestos em todo o país. Essa declaração foi baseada em métodos de contagem que envolviam varreduras aéreas por helicópteros sobre as multidões. Contudo, essa proclamação foi amplamente refutada por inúmeros especialistas, analistas independentes, universidades e meios de comunicação internacionais. Muitos argumentaram que o número de manifestantes foi significativamente exagerado por motivos políticos, visando legitimar a intervenção militar e a subsequente remoção de Morsi. Por exemplo, um estudo estatístico aproximado e análises independentes, que levaram em consideração a capacidade das praças e ruas do Egito, divulgaram que o número total de manifestantes em todo o país dificilmente excedeu um milhão, e em algumas estimativas, foi consideravelmente menor. Essa vasta discrepância nos números ilustra a profunda polarização e a batalha de narrativas que caracterizaram o período pós-Morsi, destacando a complexidade e a dificuldade de se obter uma contagem precisa em protestos de massa.
Perguntas Frequentes sobre a Revolta de 30 de Junho de 2013
- O que foi a Revolução de 25 de Janeiro de 2011?
- Foi um levante popular massivo no Egito que culminou na derrubada do regime autoritário de Hosni Mubarak, após quase 30 anos no poder. É considerada parte da Primavera Árabe e abriu caminho para as primeiras eleições democráticas do país.
- Por que Mohamed Morsi foi tão impopular após apenas um ano?
- Morsi, ligado à Irmandade Muçulmana, enfrentou acusações de concentrar poder (especialmente após a Declaração Constitucional de 2012), de governar de forma excludente com uma constituição percebida como islamista, e de falhar em resolver os problemas econômicos persistentes do Egito.
- O que significava o movimento Tamarod?
- “Tamarod” significa "Rebelião" em árabe. Foi uma campanha popular de petição lançada em abril de 2013 que coletou milhões de assinaturas pedindo a renúncia de Morsi e eleições antecipadas, tornando-se um catalisador chave para os protestos de junho de 2013.
- Quem é Abdel Fattah el-Sisi e qual foi seu papel?
- Abdel Fattah el-Sisi era o Ministro da Defesa do Egito em 2013. Ele liderou a intervenção militar que removeu Morsi do poder em 3 de julho de 2013. Posteriormente, Sisi tornou-se presidente do Egito, cargo que ocupa até hoje.
- A Revolta de 30 de Junho foi um golpe de Estado ou uma revolução popular?
- Essa é uma questão de intenso debate. Embora o exército egípcio e seus apoiadores a chamem de "revolução" impulsionada pelo povo, muitos observadores internacionais e analistas a consideram um golpe de Estado, dada a remoção militar de um presidente eleito.
- Por que há tanta controvérsia sobre o número de manifestantes em 30 de junho de 2013?
- A disparidade reflete a profunda polarização política. O exército divulgou números extremamente altos (32 milhões) para legitimar sua ação, enquanto estudos independentes e análises de especialistas apresentaram estimativas muito mais conservadoras (cerca de 1 milhão ou menos). A contagem de multidões em grandes eventos é inerentemente difícil e frequentemente politizada.